(Em homenagem ao meu pai, Pedro Dantas, que faria 62 anos hoje)

A noite em que meu pai morreu foi longa, longuíssima.
Eu e minha irmã chorávamos muito,
mas nossa dor foi, aos poucos, sendo vencida pelo torpor provocado por uma sucessão de copos de água com açúcar.
Tios, tias e primos tentavam, também atônitos pelo choque, ser fortes, tranqüilos, seguros.
Não vimos minha mãe nessa noite.
Ela estava na casa de minha avó:
lutando, gritando e temendo enlouquecer.
Guerreava contra o sofrimento que acomete aqueles que perdem, de modo trágico e repentino, o grande amor de sua vida.
Enquanto isso, eu e minha irmã derramávamos lágrimas que caíam, como torrentes,
sobre a transparência inocente de nossos pijamas infantis – repletos de estampas de bichinhos e flores.
Também me recordo de, na mão direita – no meio daquela escuridão espiritual –, trazer um anel de prata, com uma pequena estrela no centro.
Na manhã seguinte, pouco depois de acordar de um pesadelo que continuaria aterrorizante mesmo sob a luz do sol, olhei para o anel…
E vi que ele estava negro.
Nem um sinal da cor prata de antes.
Foi quando descobri que a dor excessiva
e as alterações que provoca no corpo e na alma
têm o poder de alterar minérios…
E de ofuscar, autoritárias, o brilho das estrelas.

Gói
1717/10/04