(Dedicada a Jack Kerouac, Sal Paradise, Dean Moriarty e Old Bull Lee)

Eu quero o que não descortinas
Desejo o que trazes na alma
Silêncio ou infinitas palavras
Tormentos, vazios, verões
A ausência em que te reconheces
As dores e o imenso prazer
A sorte, a esperança perdida
Os sonhos que ninguém mais vê…
Vergonhas reclusas no tempo
Pavores, insônias, injúrias
Temores e os beijos roubados
(na esquina de uma antiga rua…)

Eu quero o teu frio na barriga
E aquela intensa sensação
Da ardência do tapa na cara
Fervores de tua oração
Eu quero o teu corpo caído
Depois do tropeço no chão
E após um afago carinhoso
Oferecer-te a minha mão

Eu posso ser a água benta
Pra tua sede de vingança
Eu quero ser o anjo gouché,
Que ainda te traz esperança
De ti não quero só metade…
Eu quero o teu bem e teu mal
Até porque não se admite
Um mar existindo sem Sal

Só me interessa a intensidade
Presente em ritos de passagem
Só me comove a poesia
Que chega sem fazer alarde
E tudo em você é lirismo
E tudo em você é saudade
Amor e guerra e epopéia
Desejo, volúpia, vontade

No peito essa bala perdida
E a flecha que traz o teu nome
Um fogo cruzado sem trégua
A chama que aqui me consome

Mas quem sou eu – à queima-roupa?
Fantoche, boneca, ilusão…
Presença, passado, futuro
Estrada, rumo, direção
Eu quero o todo, o meio, o nada
Trindade que trazes na alma…
Viagem, partida, regresso
Cidades, atrasos, progressos

Eu sou oratório e o terço
Mística a te virar do avesso
Meu céu é o sorriso devoto
Com que tu ganhas e eu aposto
Sou Eva te dando a maçã
A Gênese desse amanhã
A história de futuro incerto
Pecado, castigo, perdão…

Sou fuga, delírio, destino
Roteiro, horizonte, caminho
O Evangelho, a cruz, a dor
A tentação desses desertos
Maria, de infinito amor

Goimar Dantas
São Paulo
16-12-07